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Blog de Contencioso Administrativo



Sexta-feira, 29.11.13

O Contencioso Pré-Contratual Urgente

Os meios urgentes consubstanciam um conjunto de meios processuais destinados à protecção de situações jurídicas subjectivas. Entre as impugnações urgentes inclui-se a impugnação de actos administrativos relativos à formação dos contratos. O artigo 100.º, n.º1 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (doravante, CPTA) no que respeita à impugnação da empreitada, da concessão de obras públicas, da prestação de serviços e fornecimento de bens, remete para o regime da acção administrativa especial em matéria de pressupostos processuais. Deste modo, é aplicável, nos processos especiais a que se refere, quase todo o regime dos pressupostos processuais relativos ao objecto dos processos respeitantes a actos administrativos. É um processo semelhante à acção administrativa especial, porém com uma tramitação acelerada e com um prazo de propositura da acção mais curto.

 

O contencioso pré-contratual urgente dá continuidade ao regime especial instituído pelo Decreto-Lei n.º 134/98, de 15 de Maio, para determinados contratos, em aplicação da Directiva n.º 89/665/CEE, conhecida por “Directiva-Recursos”, alargado agora aos contratos de concessão de obras públicas.

 

Este processo é uma forma de processo autónoma que resulta da necessidade de assegurar simultaneamente duas ordens de interesses, públicos e privados. Por um lado, destina-se a promover a transparência e a concorrência, através de uma protecção adequada aos interesses dos candidatos à celebração de contratos com as entidades públicas. Por outro lado, tem também como fim garantir a estabilidade dos contratos da Administração depois de celebrados, dando protecção adequada aos interesses públicos substanciais em causa e aos interesses dos contratantes.

 

No entanto, é difícil perceber a razão pela qual este meio apenas vale para contratos abrangidos pelas directivas europeias, fazendo parecer que não será uma solução suficientemente adequada para aplicar à generalidade dos contratos. Em defesa da opção do legislador poderá, todavia, dizer-se que, em defesa da própria urgência, é legítimo limitar as situações de urgência, principalmente porque no âmbito das acções relativas ao procedimento de formação dos restantes contratos se admite, embora com um único fundamento, a decisão antecipada do fundo da causa no contexto do respectivo processo cautelar[1].

 

 

Âmbito objectivo


Este meio será utilizado quando estejam em causa quaisquer decisões administrativas relativas à formação dos referidos contratos. Deste modo, pode ser realizada a impugnação de todos os actos administrativos relativos à formação desses contratos, bem como actos equiparados de entidades privadas[2].

 

Para além disso, é também este o meio adequado para a impugnação directa de “documentos contratuais” normativos, que incluem o programa de concurso, o caderno de encargos ou qualquer outro documento conformador do procedimento pré-contratual, designadamente, com fundamento na “ilegalidade” das especificações técnicas, económicas ou financeiras (artigo 100.º, n.º 2, do CPTA).

 

No caso de ser entretanto celebrado o contrato, o objecto do processo pode ser ampliado à impugnação do próprio contrato nos termos do artigo 102.º, n.º 4. Esta é uma situação paralela à da ampliação do processo normal de impugnação de actos pré-contratuais.

 

Poderá, ou não, obter-se, neste processo, a condenação à prática dos actos pré-contratuais devidos?


Primeiramente importa referir que não há nenhuma resposta normativa expressa aplicável por via da remissão feita pelo artigo 100.º, n.º 1, na medida em que esta remissão não abrange o artigo 47.º, que permite a cumulação de pedidos de anulação com pedidos de condenação, de reconstituição, entre outros.

 

De acordo com o entendimento do professor Vieira de Andrade, em termos substanciais, a sua permissão insere-se “no espírito do direito reformado”, uma vez que tem uma grande abertura processual em favor da tutela judicial efectiva e, designadamente, da cumulação de pedidos, tal como na “justiça do sistema”, que prefere a condenação nos casos de impugnação de actos negativos. Por outro lado, para o professor não se lhe poderem contrapor obstáculos processuais decisivos, na medida em que a regra da cumulação remete para a acção administrativa especial com as adaptações que se revelem necessárias. Contudo, a lei apenas se refere à impugnação de actos ou documentos, e distingue claramente as impugnações urgentes das intimações, que têm carácter condenatório.


Regime dos prazos

 

De acordo com o artigo 101.º, o prazo para a apresentação do pedido é de um mês a contar da data da notificação dos interessados ou, não havendo lugar a notificação, da data do conhecimento do acto[3]. Este prazo corresponde um alongamento do anterior que era de 15 dias, que era consensualmente considerado demasiado curto, o que conduzia a com bastante frequência a situações de desprotecção, sobretudo porque não se admitia o uso alternativo do pedido de impugnação do acto no prazo normal. Por estarmos no âmbito de um processo urgente, o prazo corre mesmo em férias judiciais, como resultada do Código de Processo Civil.

 

Apesar de grande parte da doutrina não estar em concordância com este pensamento, para o professor Aroso de Almeida, e tem sido esse o entendimento invariável da jurisprudência, este prazo vale tanto para as acções dirigidas à anulação, como para as acções de declaração de nulidade do acto impugnado. Deve ainda entender-se que o prazo de um mês vale também para a impugnação dos documentos conformadores do procedimento pré-contratual. O contencioso pré-contratual deve ser encarado como uma unidade, nas duas modalidades em que, de acordo com as Directivas-recursos, o n.º 1 e n.º 2 do artigo 100.º o desdobram. Entre estas duas previsões existe uma relação de complementaridade que explica o silêncio do segundo dos preceitos quanto à questão dos pressupostos processuais aplicáveis.

Este especial prazo de um mês tem caráter imperativo e é o único aplicável à impugnação de todos os actos administrativos relativos à formação dos contratos previstos no artigo 100.º do CPTA. As razões prendem-se com a eficácia e celeridade que se pretende assegurar, com vista a que, no momento da celebração do respectivo contrato, possa estar assegurada a sua estabilidade e a legalidade da Administração para o celebrar com o adjudicatário escolhido.

 

Podemos, então, afirmar que não é de aplicar no contencioso pré-contratual, em qualquer situação, o prazo geral de impugnação de actos previsto no artigo 58.º, n.º 2, nem a regra do n.º 4 deste mesmo artigo, por estar especialmente previsto prazo distinto de impugnação no artigo 101.º do CPTA.

 

Quanto ao eventual não exercício da faculdade de impugnação concedida pelo artigo 100.º, n.º 2, este facto não preclude a faculdade da impugnação dos actos administrativos que, ao longo do procedimento, por ventura venham a ser praticados em aplicação, ou pelo menos, no pressuposto da determinação ilegal contida no documento conformador não impugnado. Alías, para o professor Aroso de Almeida, esta solução impõe-se como ultima ratio, atendendo que a faculdade de impugnação prevista no artigo 100.º, n.º 2, foi introduzida na nossa ordem jurídica no exclusivo próprio de assegurar “um acréscimo de tutela” aos eventuais interessados em impugnar, imposto pelas directivas europeias, pelo que a sua existência não pode reverter em prejuízo desses interessados.


Restantes pressupostos

 

Relativamente aos restantes pressupostos, aplicam-se, por força do artigo 11.º, n.º 1, as regras relativas à impugnação de actos, de que é de destacar as relativas à legitimidade (artigo 55.º) e à prossecução da acção pelo Ministério Público (artigo 62.º).


Tramitação e decisão

 

Este processo segue a tramitação da acção administrativa especial, com algumas alterações, entre as quais a possibilidade da concentração numa audiência publica sobre a matéria de facto e de direito, com alegações orais e sentença imediata (artigos 102.º e 103.º). Em caso de procedência, a sentença será, em regra, anulatória ou de declaração de invalidade do acto ou documento contratual. É ainda importante referir que a lei manda expressamente estender a este processo urgente[4], embora com algumas diferenças de relevo, a possibilidade admitida em geral no artigo 45.º, de, em caso de impossibilidade absoluta de satisfação dos interesses do autor, o juiz não proferir a sentença requerida e convidar as partes a acordarem no montante da indemnização devida.


Conclusão

 

Após o estudo deste regime, podemos concluir que o processo urgente de contencioso pré-contratual afigura-se como uma forma processual que pretende uma flexibilização do acesso aos tribunais, bem como a redução da duração na resolução dos litígios. Contudo, o regime legal previsto no contencioso pré-contratual, como meio urgente, é alvo de algumas críticas. A partir do que acima foi exposto, podemos verificar que surgem divergências doutrinárias referentes a diversas matérias e pressupostos, nomeadamente quanto ao alargamento do meio processual a outras figuras contratuais para além das impostas pelas directivas europeias ou, por exemplo, a questão do prazo para a impugnação de actos nulos. Ora, para que a transparência e concorrência adequada nos negócios que envolvam interesses públicos sejam garantias efectivas deste meio processual, será indispensável um rápido e eficaz funcionamento dos tribunais e, desta forma, questiona-se se terão sido suficientes as medidas tomadas pela Reforma de 2002.

 

[1] Esta situação refere-se à possibilidade de convolação do processo cautelar em processo principal prevista no n.º 7 do artigo 132.º, quando seja manifesta a ilegalidade das especificações contidas nos documentos do concurso.


[2] A equiparação está expressamente estabelecida para os actos de sujeitos privados praticados no âmbito de procedimentos pré-contratuais de direito público (artigo 100.º, n.º 3, do CPTA e artigo 4.º, n.º 1, alínea e), do ETAF). Contrariando, desta forma, a posição jurisprudencial que considerava tais actos como declarações negociais privadas e atribuía aos tribunais comuns a competência para conhecer da sua legalidade, mesmo quando se tratava de actos praticados no âmbito de contratos sujeitos a procedimentos de direito público.

 

[3] Ao contrário do que sucede no artigo 58.º, o CPTA não estabelece, no domínio das acções do contencioso pré-contratual urgente, qualquer diferenciação de prazos. O Ministério Público não beneficia, assim, de um prazo específico de maior duração, estando também sujeito ao prazo do artigo 101.º.


[4] Artigo 102.º, n.º 5, do CPTA.

 

Bibliografia

 

ALMEIDA, Mário Aroso de, "Manual de Processo Administrativo", Almedina, 2010;

 

AMARAL, Diogo Freitas do, e ALMEIDA, Mário Aroso de, "Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo", 3ª Edição, Almedina, 2004;

 

ANDRADE, José Carlos Vieira de, "A Justiça Administrativa (Lições)", 11ª Edição, Almedina, 2011;

 

GOUVEIA, Paulo Pereira— “As Realidades da Nova Tutela Cautelar Administrativa”, Cadernos de Justiça Administrativa, Cejur, n.° 55, Janeiro/Fevereiro 2006;

 

NUNES, Adolfo Mesquita, “O processo urgente de contencioso pré-contratual no novo código de processo dos tribunais administrativos”, 2003.

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por Rita Matos às 23:07

Sexta-feira, 29.11.13

Os actos administrativos impugnáveis

Uma das formas de processo especiais do Contencioso Administrativo é a impugnação de actos administrativos, disposto nos artigos 50.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA). Está em causa a tutela dos particulares através da eliminação da ordem jurídica de um acto emanado da administração, como indica o artigo 50.º CPTA, através da anulação ou declaração de nulidade ou de inexistência desse acto. Um dos pressupostos desta forma de processo é a impugnabilidade do acto, sendo que nem todos os actos emanados da Administração são susceptíveis de serem impugnados.

Neste trabalho procurarei fazer uma análise breve de quais os critérios para que um acto possa ser impugnado, começando por apresentar uma noção de acto administrativo e, partindo desta noção, quais os pressupostos que tornam um acto impugnável, apontando algumas das principais alterações trazidas pela Reforma 2002/2004 a esta matéria.

 

Noção de acto administrativo

 

O acto administrativo consubstancia uma das principais formas de actuação da Administração; no entanto, é um conceito que vai para além de um simples acto da administração.

O artigo 120.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) dispõe que: ” Para os efeitos da presente lei, consideram-se actos administrativos as decisões dos órgãos da Administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.”

 

Seguindo a sistematização do Professor Marcelo Rebelo de Sousa1, importa então analisar cada um dos elementos presentes nesta norma, de forma a compreender qual o seu âmbito concreto.

  1. Decisão”: para que um acto seja qualificado como um acto administrativo, tem de consubstanciar uma decisão, o que implica que terá de partir de uma conduta voluntária; terá de ser necessariamente um acto positivo, não cabendo neste conceito as omissões (ressalvando-se a questão do acto tácito que não cabe aqui discutir); o acto será também material e unilateral, distinguindo-se assim dos contratos administrativos. Por fim, este acto terá de ter um conteúdo autónomo, visando a produção de efeitos próprios.
  2. “Órgãos da administração”: o acto terá também de emanar de um órgão da Administração Pública tal como o Governo, Institutos públicos, Empresas Públicas, Universidades, etc.. Conclui-se, portanto, que não se consideram actos administrativos os actos emanados de privados mesmo que integrados na Administração Pública em que não esteja em causa o exercício da função administrativa. Para além disto, também não caberão neste conceito os actos emanados de órgãos integrados nos poderes político, legislativo e jurisdicional.
  3. “Ao abrigo de normas de direito público”: indica que não caberão no conceito os actos de gestão privada da administração.
  4. Visem produzir efeitos jurídicos”: o acto em causa tem de produzir um efeito jurídico tal como constituição, modificação ou extinção de situações jurídicas assim como declarações de nulidade, prazos, actos preparatórios, etc.. Quanto aos actos de execução, parece que caberão no conceito desde que apresentem um conteúdo autónomo, caso contrário não consubstanciará uma decisão.
  5. “Situação individual e concreta”: este é um ponto muito importante, pois permite logo distinguir dos regulamentos, clarificando que os actos administrativos não são normativos; serão portanto determináveis os destinatários assim como as situações a que se aplicam. Uma das questões mais complexas neste âmbito é em relação aos actos gerais, muito importante em sede de impugnação, sendo que se verifica que também serão actos administrativos já que a determinação é feita mas será em termos genéricos (p.ex.: empresas alimentares), sendo possível a determinação dos sujeitos.

Estes são, portanto, os elementos essenciais de um acto administrativo. Para efeitos desta classificação, o artigo 120.º CPA não exige que se trate de um acto externo.

Quanto aos actos de indeferimento, ver-se-á infra que para estes a forma de processo “ideal” não é a impugnação mas o Professor Rebelo de Sousa2 alerta para o facto de isso não implicar que não se tratem de actos administrativos: estes preenchem todos os pressupostos acima enunciados, regulando efectivamente uma situação jurídica, mesmo que no sentido oposto ao pretendido pelo particular. Esta orientação é corroborada pelos artigos 47.º/2 a) e 66.º/2 do CPTA, assim como pelo facto de em certas situações ser admitida a impugnação destes (artigo 51.º/4 CPTA).

Verifica-se, portanto que o nosso ordenamento jurídico adopta um conceito amplo de acto administrativo, tendo surgido muito ligado ao contencioso, como uma forma de “garantia à administração e, posteriormente, aos particulares”3 de acordo com o preceito constitucional do artigo 268.º/4.


Noção de acto impugnável

 

Tendo em conta o conceito de acto administrativo, cabe agora delimitar que actos podem ser impugnados em sede do Processo Administrativo. Ficarão desde já “de fora” os actos instrumentais, os actos materiais e os comportamentos4 pois estes não apresentam carácter decisório não se incluindo, por isso, na noção de acto administrativo.

No entanto, verifica-se que estes dois conceitos não coincidem exactamente. Por um lado, os actos impugnáveis terão um âmbito mais vasto porque o artigo 51.º/2 CPTA inclui as decisões materialmente administrativas proferidas por entidades que não fazem parte da Administração Pública e de entidades privadas que actuam ao abrigo de normas de Direito Administrativo, que não são considerados órgãos públicos para efeitos do artigo 120.º CPA. Esta decisão do legislador deve-se ao facto de desta forma ser dada maior protecção aos particulares, apresentando-se um leque mais vasto de actos susceptíveis de impugnação.

 Por outro lado, o conceito de acto impugnável será mais restrito porque só se inclui no seu âmbito os actos com eficácia externa, que, como vimos não é pressuposto da qualificação como acto administrativo, sendo necessária a produção de efeitos na esfera jurídica dos seus destinatários (ressalvando-se aqui a hipótese da impugnação de actos cujo procedimento ainda não está concluído, ponto a analisar infra).

Tal como já foi referido, o artigo 50.º CPTA indica que o objecto da acção administrativa especial de impugnação será a “anulação ou declaração de nulidade ou inexistência de um acto”. Isto implica que o ponto central do processo será a análise das vicissitudes do acto e não os seus efeitos, sendo que a causa de pedir do processo deverá ser a ilegalidade do acto e não a lesão do particular5.

 

Actos administrativos impugnáveis

 

O artigo 51.º/1 CPTA apresenta dois critérios: eficácia externa do acto e a lesão de direitos ou interesses legalmente protegidos.

Quanto ao critério da eficácia externa, este não implica que a produção de feitos se tenha de verificar necessariamente naquele momento mas sim que a natureza dos efeitos que o acto se destina a produzir tenha esse carácter. Isto é reforçado pelo facto de o artigo 54.º dispor que pode ser impugnado um acto que ainda não produziu os seus efeitos.

De facto, uma das alterações trazidas pela Reforma 2002/2004 foi o alargamento da impugnabilidade através da consagração destes dois critérios. No entanto, na opinião do Professor Vasco Pereira da Silva6, a redacção do artigo 51.º/1 não foi a mais feliz, devendo distinguir-se entre as situações de tutela de um direito de um particular perante a Administração, em que a impugnação terá uma função subjectiva de protecção do particular, sendo mais relevante o critério da lesão de direitos ou interesses legalmente protegidos e as acções para defesa da legalidade e do interesse público, em que estamos perante uma função objectiva (sendo aqui relevantes a acção pública e a acção popular), em que o critério principal será o da eficácia externa. O que se verifica é que o artigo 51.º parece indicar que o critério da eficácia externa é mais importante do que o da lesão de direitos e interesses legalmente protegidos, o que é incomportável à luz do nosso ordenamento jurídico.

Prosseguindo a análise do artigo 51.º, verifica-se que esta disposição já não consagra o critério da definitividade horizontal, ou seja, que a possibilidade de impugnação de um acto não depende já de o procedimento que lhe deu origem estar concluído. De facto, antes da Reforma, para que um acto pudesse ser impugnado era necessário que o particular aguardasse pelo fim do procedimento, o que era totalmente descabido, pois enquanto tal não acontecesse os seus direitos e interesses estariam a ser lesados. Hoje, verifica-se que é possível impugnar um acto mesmo que o procedimento que lhe dá origem ainda esteja a decorrer.

Isto não implica que não seja possível ao particular vir requerer a impugnação de um acto no final do procedimento com base em irregularidades ocorridas na constância do mesmo, como é disposto no artigo 51.º/3, ressalvando-se as situações em que o acto tenha determinado a exclusão do particular do procedimento, situação em que o particular deve agir imediatamente, e o disposto em lei especial.

Tendo sido afastado o critério da definitividade horizontal, a questão que se coloca é se o regime ainda mantém o critério da definitividade vertical, expresso através da figura do recurso hierárquico necessário. Este citério implicava que, antes de o particular recorrer aos tribunais para apresentar a sua pretensão, deveria esgotar os meios administrativos necessários, nomeadamente o recurso hierárquico. De facto, verifica-se que o CPTA já não faz qualquer referência a esta figura, sendo possível ao particular não só recorrer aos tribunais mesmo antes de o procedimento estar concluído como não necessita de ter esgotado outras formas de obviar o acto.

 No entanto, o Professor Mário Aroso de Almeida7 ressalva a possibilidade de ainda haver normas especiais que prevejam esta figura e que devem ser respeitadas, concluindo que os actos com eficácia externa podem ser imediatamente impugnáveis sem necessidade de esgotamento dos meios administrativos na falta de disposição em contrário, fazendo, portanto uma interpretação restritiva. O Professor Vasco Pereira da Silva8 critica esta posição por várias razões tais como o facto de a revogação das regras gerais dever implicar a revogação das regras especiais, concluindo até que neste caso o mais natural é estas caducarem por falta de objecto. Para além disso, o artigo 8.º/2 CPTA dispõe que devem ser evitadas exigências inúteis o que acabará por ser a situação de necessidade do recurso hierárquico até porque, e o que me parece ser o argumento mais forte, o recurso hierárquico, à luz do novo regime, tornou-se “desnecessário”, pois a sua necessidade devia-se essencialmente ao facto de os particulares não terem uma forma especial de impugnação dos actos: agora já têm, sendo que esta figura se tornou obsoleta.

Assim sendo, parece-me que a posição do professor Aroso de Almeida se encontra ultrapassada, pois já não há qualquer justificação para se ressalvar qualquer tipo de aplicação da figura do recurso hierárquico necessário, devendo o regime ser revisto de forma a não existirem incongruências.

 

Como já tinha sido referido, o artigo 54.º CPTA aponta que também é possível a impugnação de actos administrativos cujos efeitos ainda não se tenham produzido. Estamos a falar não de actos nulos, que nunca chegam a produzir efeitos e que obviamente devem poder ser impugnados, mas sim de actos cujos pressupostos de aplicação ainda não se encontram preenchidos, como por exemplo a sua publicação. Para que tal seja possível, é necessário que o acto já esteja a ser executado ou que “seja seguro ou muito provável que o acto irá produzir efeitos, designadamente por a ineficácia se dever apenas ao facto de o acto se encontrar dependente de termo inicial ou de condição suspensiva cuja verificação seja provável, nomeadamente por depender da vontade do beneficiário do acto.” (artigo 54.º/1 b)). Estas são situações em que já há a possibilidade de afectação da esfera jurídica dos seus destinatários, havendo necessidade de tutela jurídica, ou seja, dependerá da existência ou não de interesse em agir.

É ainda importante referir que para este caso o artigo 59.º CPTA dispõe que o prazo só conta a partir da produção de efeitos; além disso, o 54.º/2 alerta para o facto de o acto já estar a ser executado não impede a utilização de meios mais favoráveis de reacção contra aquele acto.

Por fim, resta referir que para que um acto seja impugnável não será necessária nenhuma forma especial ou a inexistência desta, como indica o artigo 52.º/1 na linha do disposto no artigo 268.º/4 da CRP.

Actos não impugnáveis

  • Actos de indeferimento

O artigo 51.º/4 CPTA aponta como não impugnáveis os actos administrativos de indeferimento, actos em que a administração se recusa a praticar um determinado acto administrativo. Isto porque a forma de processo correcta para se reagir contra estes actos não é a impugnação mas sim a condenação à prática de acto devido, tal como indicam os artigos 67.º/1 b) e c) e 66.º/2 CPTA, pois a intenção do particular vai para além da simples eliminação daquele acto desfavorável da ordem jurídica, pretendendo sim que seja realizado um acto favorável à sua pretensão. É a condenação à prática de acto devido que melhor protege o particular, indo de encontro aos seus interesses e que permite a melhor forma de discussão do acto, pois é analisado se a Administração deveria ter decidido daquela forma. Isto só é possível à luz do Contencioso Administrativo pós-Reforma pois implica que os tribunais possam exigir à Administração que tome uma decisão, discutindo-se como se conjuga com a discricionariedade.

O Professor Mário Aroso de Almeida9 questiona se já se estes actos já serão impugnáveis caso a pretensão do particular seja a simples eliminação daquela disposição do ordenamento jurídico e não uma tomada de decisão, justificando que não pretende obter o acto ilegalmente recusado mas simplesmente a remoção da ordem jurídica do acto ilegal, tendo um interesse autónomo em obter tal situação. Como exemplo pode referir-se um caso de um construtor que pediu licença de construção que lhe foi recusada: tendo perdido já o interesse em construir naquele momento, deve ser ressalvada a hipótese de querer construir no futuro, necessitando da licença de construção; caso não pudesse apenas impugnar o acto teria de esperar pelo momento em que voltasse a ter interesse em construir para requerer a condenação à prática de um acto devido, mas o prazo já teria passado.

Na prática, o artigo 51.º/4 dispõe que caso seja pedida impugnação nesta situação, o tribunal convida o autor a substituir a petição inicial. Se não o fizer, haverá absolvição da instância (artigo 89.º CPTA). Caso o autor tenha cumulado um pedido de impugnação com um pedido de condenação à prática de acto devido, não haverá necessidade de correcções.

  • Actos confirmativos

Por seu lado, o artigo 53.º CPTA consagra a regra da não impugnação de actos que se limitem a confirmar um acto administrativo anterior, impedindo a impugnação de actos que se pronunciavam acerca de uma decisão já tomada. O Professor Mário Aroso de Almeida10 refere que nestas situações já não estamos perante verdadeiros actos administrativos mas sim perante “meras declarações enunciativas ou representativas da realidade”, uma forma de a Administração reforçar a sua decisão. Faz, portanto, sentido que não se admita a impugnação de um acto por quem já tenha impugnado a decisão anterior, que ele se limita a confirmar, assim como é compreensível que não se possa impugnar um acto deste tipo por quem sabia da existência de um acto anterior confirmado por aquele e que nada fez, como dispõe o artigo: “Uma impugnação só pode ser rejeitada com fundamento no carácter meramente confirmativo do acto impugnado quando o acto anterior:

a) Tenha sido impugnado pelo autor;

b) Tenha sido objecto de notificação ao autor;

c) Tenha sido objecto de publicação, sem que tivesse de ser notificado ao autor.”

 Caso não estejamos perante uma destas situações, o acto confirmativo é impugnável: esta opção do legislador deve-se ao facto de o particular poder não ter tido meios para tomar conhecimento da existência do acto anterior e/ou de que aquele acto era meramente confirmativo. Parece, portanto, que haverá um maior número de actos confirmativos impugnáveis do que não impugnáveis.

  • Actos de execução

Como já foi referido, os actos de execução são actos administrativos apenas quando apresentam um conteúdo autónomo, não sendo por isso impugnáveis fora dessas situações, visto que se tratam de uma mera aplicação de outros actos administrativos. Estes são actos que apenas vêm acrescentar algo a um acto já existente, devendo ser o acto principal a ser impugnado e não este. A lógica é semelhante à da questão dos actos confirmativos.

 

Em conclusão, regra geral serão inimpugnáveis os actos de indeferimento, os actos confirmativos e os actos de execução, apesar de haver algumas excepções: de facto, os artigos 52.º/2 e 3 apresentam situações em que a impugnação é possível, como quando estamos perante um acto contido em diploma legislativo ou regulamentar e o particular não se apercebeu desta situação, tendo deixado passar o prazo e quando os destinatários dos actos sejam identificados apenas no segundo acto, só sendo possível a impugnação nesse momento. O Professor Mário Aroso de Almeida11 aponta também que deve ser possível impugnar estes actos quando o vício em causa for de eles mesmos e não do acto confirmado ou executado.

Conclusão:

Finda a análise deste regime, posso apenas concluir que de facto a tutela do particular é o principal objectivo do legislador, que procura permitir ao particular a protecção dos seus direitos e interesses legalmente protegidos em muitos mais casos e de uma forma mais simplificada, algumas vezes até auxiliando-o (como é o caso do artigo 51.º/4). Parece-me que as mudanças trazidas pela Reforma permitem afirmar que o artigo 268.º/4 CRP é efectivamente aplicado.

Notas:

1-      SOUSA, Marcelo Rebelo de/ MATOS, André Salgado de, “Direito Administrativo...,2004, páginas 73 e seguintes

2-      SOUSA, Marcelo Rebelo de/ MATOS, André Salgado de, “Direito Administrativo...,2004, página 83

3-      AMARAL, Diogo Freitas do, “Curso de Direito Admnistrativo”, vol. II, 2001

4-      ANDRADE, José Vieira de, “A Justiça…”, Coimbra, 2012, p. 86

5-      Idem nota 4

6-      SILVA, Vasco Pereira da, “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise”, Almedina, Coimbra 2009, p.344

7-      ALMEIDA, Mário Aroso de, ”O Novo Regime do P. T. A.”, Coimbra, 2005, páginas 141 e ss.

8-      SILVA, Vasco Pereira da, “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise”, Almedina, Coimbra 2009, p.354 e ss.

9-      ALMEIDA, Mário Aroso de, ”O Novo Regime do P. T. A.”, Coimbra, 2005, p.148 ss.

10-   Idem nota 9, p. 155

11-   Idem nota 9

 

Bibliografia:

  • ALMEIDA, Mário Aroso de, “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, Coimbra 2013
  • ALMEIDA, Mário Aroso de, ”O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, Coimbra, 2005
  • AMARAL, Diogo Freitas do, “Curso de Direito Admnistrativo”, vol. II, Almedina, Coimbra, 2001
  • ANDRADE, José Vieira de, “A Justiça Administrativa”, Almedina, Coimbra 2012
  • SILVA, Vasco Pereira da, “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise”, Almedina, Coimbra 2009
  • SOUSA, Marcelo Rebelo de/ MATOS, André Salgado de, “Direito Administrativo Geral”, Tomo II, Publicações D. Quixote, 2009

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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por Raquel Nogueira às 17:09

Quinta-feira, 28.11.13

Limites funcionais da jurisdição administrativa à luz do artigo 71.º, n.º 2 CPTA

Nota Introdutória

            O presente artigo versará sobre os limites funcionais da jurisdição administrativa, enquanto ponto de equilíbrio entre três princípios fundamentais que pautam a conduta dos Tribunais e da Administração: o princípio da separação de poderes (art.º 114º CRP) que exige a divisão do poder estadual, e o respeito pelo domínio funcional reservado aos respectivos órgãos; os princípios da legalidade e da tutela jurisdicional efectiva (artigos 20.º e 268, n.º 4 CRP), que apontam para uma crescente função de tutela dos Tribunais param com os cidadãos, perante a função estadual exercida pelo poder executivo; por fim, o princípio da discricionariedade administrativa que Consiste numa liberdade dada à Administração desta poder escolher entre várias alternativas juridicamente admissíveis.

            Com a reforma do contencioso administrativo de 2002/2003, verificou-se uma alteração de extrema relevância, que veio a dar aos Tribunais uma função delimitadora da margem de livre apreciação da Administração, sendo que, será dada maior relevância ao artigo 71 n.º 2 CPTA, que marca um dos principais pilares desta alteração, denotando-se nesta temática, tal como no caso da legitimidade, uma inspiração germânica, da qual o legislador português retirou vários aspectos de modo a implementar este regime.

            Não obstante da novidade que constitui esta matéria, será de referir que já em 1984, o artigo 6.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 129/84, de 27 de Abril) ao determinar que “os recursos contenciosos são de mera legalidade” restringindo os poderes do tribunal às questões de legalidade, vedando-lhes o controlo das decisões administrativas tomadas segundo critérios de mérito, determinando que apenas o exercício ilegal de poderes administrativos seria susceptível de controlo pelo tribunais, no entanto, tal disposição não indicava qual o momento em que a actuação da administração deixava de relevar na esfera da vinculação, e passava a integrar o espaço próprio de auto-determinação da Administração[1].  

            Esta opção acaba por consubstanciar um novo instituto processual, que confere ao juiz poderes de injunção para impor directamente a constituição pela Administração de situações jurídicas administrativas na esfera dos particulares, o que, tal como acima foi exposto, poderá levantar diversas questões quanto ao respeito pelos princípios em causa, merecendo por isso uma especial análise.

 

A articulação de princípios e o critério seguido pelo CPTA

           

            Como será de fácil compreensão, tanto o princípio da separação de poderes, como o princípio da legalidade (acompanhado pela consagração da garantia da revisão jurisdicional dos actos administrativos) serão “equilibrados” através da definição de limitações funcionais à jurisdição administrativa, o que, permitirá igualmente um equilíbrio com a margem de livre apreciação da Administração.

            Ora, tais limites deverão garantir que os tribunais apenas apreciam a actuação da Administração no sentido de conformidade legal e com os princípios que a regem, não podendo nunca pronunciar-se sobre o mérito da decisão, não obstante de existirem determinados casos que poderão estar no limiar entre função jurisdicional e violação do princípio da separação de poderes, cuja análise será realizada mais adiante.

            Estes limites necessariamente impostos aos tribunais decorrem não apenas do estatuto de independência dos juízes face a qualquer responsabilidade política, mas igualmente pelo facto de não competir aos tribunais apreciar quaisquer decisões da Administração que não tenham sido determinadas por normas jurídicas, mas antes se baseiem na margem de livre apreciação que é conferida à administração[2].

            Pela relevância basilar desta matéria ao nível processual, o legislador do CPTA, refirmou o princípio da limitação funcional da jurisdição administrativa, no artigo 3.º, n.º 1, nos seguintes termos: “No respeito pelo princípio da separação e interdependência dos poderes, os tribunais administrativos julgam do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação”. Com a consagração daquele princípio, o legislador português procurou assegurar que o juiz apenas intervirá na avaliação da actuação da administração numa situação de legalidade ou juridicidade, não podendo nunca atender a critérios extrajurídicos ao proceder a esta avaliação[3].   

            De modo a concretizar este princípio, o legislador impôs determinadas “marcas” do mesmo, nomeadamente nas zonas em que poderiam surgir, com maior facilidade, situações de indefinição, como é possível observar pelo artigo 71.º, n.º 2 CPTA (ao qual será dada uma atenção especial), e pelos artigos 95.º, n.º3 e 179.º, n.º 1.

            Esta solução, de matriz germânica, acaba por ser considerada como a mais equilibrada, e como aquela que assegura uma tutela e uma articulação entre os vários princípios, salvaguardando eventuais indefinições que os poderiam prejudicar.

 

Poderes de pronúncia do tribunal na condenação da Administração à prática de actos devidos (artigo 71.º, n.º2 CPTA)

 

            O artigo 71.º, n.º 2 CPTA, consagra as limitações ao conteúdo das sentenças, naquilo que concerne à condenação da Administração à prática do acto devido, fazendo-o nos seguintes termos: “Quando a emissão do acto pretendido envolva a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa e a apreciação do caso concreto não permita identificar apenas uma solução como legalmente possível, o tribunal não pode determinar o conteúdo do acto a praticar, mas deve explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do acto devido”.

Quanto ao conceito em si, algumas críticas são elaboradas, nomeadamente à falta de densificação quanto às “valorações próprias do exercício da função administrativa”[4], sendo que a caracterização desse conceito será aprofundada adiante.

Caberá antes observar que esta opção do CPTA, permite a um particular, sempre que se sinta lesado pela prática de um acto administrativo, ou, tendo dirigido à administração um pedido e esta não se tiver pronunciado (dentro do prazo legalmente exigido), propor uma acção de condenação da Administração à prática daquele acto, ou do acto que o particular considere ser devido, sendo que, nesta situação, o Tribunal não estará apenas limitado a observar se a recusa do acto, ou a não manifestação de qualquer posição por parte da Administração foi ilegal, mas antes caber-lhe-á observar do mérito do pedido do particular, e através dessa apreciação condenar ou não a administração à prática de determinado acto[5].

Como tal, será desde logo possível afirmar que esta ampliação dos poderes de pronúncia do juiz poderá criar uma “zona cinzenta” que poderá consubstanciar uma intromissão do poder jurisdicional na esfera administrativa. Com efeito, o Tribunal poderá condenar a Administração a praticar um acto quando este seja legalmente devido, sendo que essa situação se verifica sempre que o órgão de administração, apesar de ter um dever de decisão, ter agido ilegalmente (tanto por ter agido como por se ter recusado a agir[6]). Desta situação, decorre a importância do artigo 71.º CPTA, que pretendeu salvaguardar e impedir a criação desta “zona cinzenta” que a existir, seria inconstitucional por violação do artigo 114.º CRP, ao impor determinado limite da actuação dos tribunais que garantem o respeito pela margem de livre apreciação conferida à Administração, impedindo igualmente que existisse uma contradição dentro do próprio CPTA dado o princípio consagrado pelo artigo 3.º, n.º 1.

Da análise do artigo 71.º, n.º 2 CPTA, resulta que esta matéria irá relevar nomeadamente quando a decisão do tribunal possa recair em formulações próprias do exercício da função administrativa, conceito que, tal como anteriormente exposto, carece de densificação, sendo de referir a existência de diversas teorias observadas pela doutrina jurídico-administrativa alemã, que, dada a natureza do artigo em análise, não serão alvo de aprofundamento[7].

Ora, numa tentativa de delimitar o núcleo que cabe à Administração e que não poderá nunca ser ultrapassado por qualquer decisão jurisdicional, considero que esse limite estará sempre na garantia do respeito pela discricionariedade e margem de livre apreciação da administração. Esta afirmação poderá ser considerada banal, ou até mesmo bastante óbvia, mas sê-lo-á mesmo? Para a análise dessa situação, deveremos verificar com critério os limites conferidos à margem de livre apreciação e à discricionariedade administrativa (inseridas na matéria da margem de livre decisão)

            A margem de livre decisão administrativa consiste num espaço de liberdade da actuação administrativa, conferido por lei e tendo como limite o bloco de legalidade[8], tendo como ratio a limitação prática da função legislativa (na medida em que é imposta uma margem de abertura das normas legais à Administração, para que esta possa adaptar aos casos concretos não previstos pelo legislador e à evolução tecnológica, social, económica e cultural) e o princípio da separação de poderes enquanto critério de distribuição racional das funções do estado pelos seus órgãos (como foi salientado anteriormente, a separação de poderes conduz à diminuição da densidade normativa, possibilitando à administração uma margem de liberdade de actuação, impondo igualmente uma margem de liberdade face ao poder judicial). De salientar que são apontadas algumas desvantagens à margem de livre decisão[9], sendo de destacar a perda de alguma segurança jurídica e a introdução de alguma desigualdade friccional, não obstante desta garantir uma maior justiça e adequação do direito, evitando um tratamento normativamente padronizado de cada caso (dado que a Administração terá em conta as características do caso concreto). Outra das consequências, na qual poderemos claramente observar a preocupação do legislador com a consagração do artigo 71.º, n.º 2 CPTA, prende-se com a falta de controlo jurisdicional sobre a administração neste âmbito, dado que os tribunais não poderão nunca efectuar juízos de mérito sobre a actuação da Administração, restringindo-se apenas a efectuar um juízo de legalidade quanto ao acto praticado (ou omitido) por aquela, sendo de referir que, caso esse limite não existisse, poderíamos criar uma dupla administração[10].

            Naquilo que concerne às desvantagens apontadas à margem de livre decisão administrativa, considero que o regime da condenação da administração à prática do acto devido (artigo 66 ss. CPTA) veio colmatar a possibilidade de lesão do valor da segurança jurídica, dado que o particular tem a garantia que, caso a administração não pratique o acto legalmente devido (quer através de uma acção de apreciação positiva ou negativa, quer de uma omissão), poderá recorrer aos tribunais administrativos de modo a salvaguardar a sua posição e garantir o cumprimento da legalidade[11].

            Analisando a discricionariedade, importa referir que esta consista numa liberdade dada à administração, na qual esta poderá escolher entre várias alternativas juridicamente possíveis, sendo possível distinguir diversas modalidades[12]: discricionariedade de acção (alternativa da Administração entre agir e não agir); discricionariedade de escolha (na qual a Administração irá escolher entre duas ou mais actuações predefinidas por lei); discricionariedade criativa (criação da actuação concreta dentro dos limites jurídicos aplicáveis). De referir que a existência da discricionariedade pressupõe o exercício de interpretação normativa, podendo ser retirada de diversas expressões como «poder», «faculdade», «competir», entre outros, sendo que o exercício da discricionariedade implica critério de adequação e oportunidade na decisão da Administração de modo a garantir que esta irá encetar pela solução que mais favorece a prossecução do interesse público.

            Quanto à margem de livre apreciação, esta resulta numa liberdade atribuída por lei à Administração, que confere o poder de apreciação das situações de facto que dizem respeito aos pressupostos das suas decisões, sendo comummente apontados como a raiz da margem de livre apreciação, os conceitos indeterminados[13], considerando-se a sua consagração como uma indicação de que o legislador remeteu para a apreciação do caso concreto pela Administração, a solução para determinada situação, não obstante desta liberdade avaliativa ter determinados limites, nomeadamente os decorrentes da lei.

            Uma vez analisado o regime destas duas figuras de enorme importância na regulação da intervenção da Administração, iremos demonstrar de que forma é que as mesmas poderão responder aos habituais casos apontados pela doutrina[14]:

 

a)      A pronúncia condenatória à prática de actos vinculados (art. 71.º, n.º 1 CPTA)

 

Esta situação é verificada nos casos de emissão do acto administrativo que corresponde à pretensão material do interessado resultar de forma vinculada da interpretação da norma administrativa, na qual o Tribunal irá impor a “prática do acto devido”, ou seja, irá proferir uma sentença condenando a Administração a emitir um acto administrativo com sentido e conteúdo específico e totalmente densificados[15].

      Nesta situação, não estará em causa o núcleo valorativo do exercício da função administrativa, dado que será uma disposição normativa que permite ou não a determinado particular, ter procedente determinada pretensão[16], ou seja, não existe uma margem de livre decisão administrativa, dado que a Administração deverá apenas verificar se determinados pressupostos legalmente definidos se encontram preenchidos, não podendo nunca extravasar o seu âmbito.

 

b)     Redução a zero da margem de livre decisão

 

No decurso dos limites à margem de livre decisão poderá resultar de determinado caso, que passe a existir apenas uma decisão juridicamente admissível. Essa situação, comummente designada como redução a zero da margem de livre decisão, decorrerá da verificação de diversos pressupostos, que permitirão concluir que a administração só poderia optar por uma única decisão.

Não estará aqui em causa nenhuma situação em que das várias alternativas possíveis, o tribunal opte por uma, antes uma situação que, por força do princípio de legalidade impõe à Administração optar por uma determinada via, dado que as restantes seriam contrárias ao direito[17]. Ou seja, não é aqui posta em causa qualquer autonomia da Administração ou qualquer violação do princípio da separação de poderes (art.º 114 CRP), antes se pretende tutelar o princípio da legalidade evitando o resultado absurdo que seria a Administração, a quem incumbe a prossecução do interesse público, vir a optar por uma solução ilegal.

Em jeito de conclusão, é patente que nestes casos, o núcleo valorativo da função administrativa não é de todo lesado, dado que, como exposto anteriormente, este estará vinculado à lei, sendo que, será essa vinculação que fará com que a Administração tenha de seguir um determinado “caminho” de modo a solucionar aquela situação, sob pena de não prosseguir o interesse público (função primordial que lhe está destinada).

 

 

Conclusão

 

      Através deste breve estudo, foi-nos possível observar a opção do legislador do CPTA, que pretendeu não só tutelar o princípio da separação de poderes (artigo 114.º CRP e artigo 3.º. n.º 1 CPTA) e os princípios da legalidade e da tutela jurisdicional efectiva (artigos 20.º e 268, n.º 4 CRP), como igualmente tutelar os interesses que o particular legitimamente tenha direito junto da Administração.

Esta opção foi alvo de algumas críticas pelo facto de poder consubstanciar zonas de indefinição que poderiam colocar em causa os princípios acima expostos, sendo habitual o recurso ao artigo 71.º, n.º 2 CPTA de modo a fundamentar esta crítica (dada a falta da sua densificação).

Não obstante dessas críticas serem claramente válidas e merecedoras de enorme respeito, não as acompanho, dado que aquilo que o legislador procurou garantir foi uma substancial tutela do interesse público, sublinhando a necessidade de não ser posto em causa o núcleo valorativo próprio da função administrativa.

Tal como foi anteriormente exposto, nas várias situações em que essa situação se poderia verificar, não observamos qualquer limitação da margem de livre decisão administrativa com a intervenção dos tribunais, dado que estes apenas efectuam juízos de legalidade sobre a decisão (ou falta dela) da Administração, não realizando quaisquer juízos de mérito quanto a essa actuação. Ora, sendo verdade que muitas vezes esses juízos podem “forçar” a Administração a encetar uma determinada situação, tal não decorre de uma substituição desta por parte dos Tribunais, antes decorrerá do respeito pelas normas com as quais a Administração estará vinculada.

Não se trata de uma redução da margem de livre decisão da Administração, mas antes de uma garantia que esta respeita os limites impostos pela lei, respeito este que garante uma substancial tutela do interesse público, dado que permite garantir o respeito por parte da Administração de certos limites.

Uma última ideia que pode ser extraída do regime consagrado pelo legislador do CPTA, é que este procurou para além de consagrar o princípio da separação de poderes, garantir que todos os poderes têm limites cujo respeito deverá ser garantido pelos Tribunais, por forma a impedir que estes poderes se tornem absolutos deixando o particular totalmente à mercê da Administração. Ou seja, à Administração é conferida a margem de livre decisão de modo a que esta avalie, dado o caso concreto, qual a solução que, dentro dos trâmites da legalidade, melhor prossegue o interesse público, sendo que, caso não o faça, poderá o particular recorrer aos tribunais que avaliarão a situação do prisma da legalidade e nunca do mérito da decisão, evitando a figura da dupla administração, e salvaguardando o princípio da separação de poderes.

 

 



[1] Cfr. António Cadilha, Os poderes de pronúncia jurisdicionais na acção de condenação à prática do acto devido, in «Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia» Volume II, Coimbra Editora, 2011.

[2] Cfr. Sérvulo Correia, “Acto Administrativo e Âmbito da Jurisdição Administrativa”, in Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Separata dos Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Rogério Soares, Coimbra, 2002.

[3] Cfr. António Cadilha, Os poderes de pronúncia jurisdicionais na acção de condenação à prática do acto devido, in «Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia» Volume II, Coimbra Editora, 2011.

[4] A falta de densificação deste conceito é criticada por grande parte da doutrina, sendo de destacar: Vieira de Andrade, “A Justiça Administrativa (Lições)”, 11ª edição, Almedina, Coimbra, 2011; Vasco Pereira da Silva, “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise – Ensaio Sobre as Acções no Novo Processo Administrativo”, 2ª. edição, Almedina, Coimbra, 2009; Mário Aroso de Almeida, “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, Coimbra, 2010.

[5]Mário Aroso de Almeida, O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 4ª. edição, Almedina,  Coimbra, 2007.

6 Cfr. António Cadilha, Os poderes de pronúncia jurisdicionais na acção de condenação à prática do acto devido, in «Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia» Volume II, Coimbra Editora, 2011.

 

 

 

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[7] Não obstante dessa situação, o aprofundamento dessas teorias, cuja importância é basilar, poderá ser feita em, Cfr., António Cadilha, Os poderes de pronúncia jurisdicionais na acção de condenação à prática do acto devido, in «Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia» Volume II, pp. 174 ss..

[8] Cfr. Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, “Direito Administrativo Geral – Tomo I – Introdução e Princípios Fundamentais”, 3ª edição, Dom Quixote, 2008.

[9]Cfr. Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. I, 3.ª ed., Coimbra, 2006.

[10] Cfr. Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, “Direito Administrativo Geral – Tomo I – Introdução e Princípios Fundamentais”, 3ª edição, Dom Quixote, 2008

[11] Apesar desta situação, o período, na maioria do casos, demasiado extenso do processo administrativo, poderá ter a consequência perversa de afastar os particulares do recurso a qualquer tutela jurisdicional, sendo um aspecto cuja modificação será fundamental para que os ideais inseridos no CPTA sejam postos em prática.

[12] Cfr. Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, “Direito Administrativo Geral – Tomo I – Introdução e Princípios Fundamentais”, 3ª edição, Dom Quixote, 2008.

[13] Cfr. Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol. I, 3.ª ed., Coimbra, 2006.

14 Cfr. António Cadilha, Os poderes de pronúncia jurisdicionais na acção de condenação à prática do acto devido, in «Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia» Volume II, Coimbra Editora, 2011; Cfr. Sérvulo Correia, “Direito do Contencioso Administrativo I”, Lex, 2005

 

 

 

[15] Cfr. António Cadilha, Os poderes de pronúncia jurisdicionais na acção de condenação à prática do acto devido, in «Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia» Volume II, Coimbra Editora, 2011.

[16] Um caso que demonstra esta situação é o do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 17 de Janeiro de 2008 (Proc. n.º 01376/06) no qual um funcionário da Direcção-Geral de Impostos, tendo sido nomeado em regime de substituição, para um cargo de chefia, requeria a condenação à prática do acto devido contra o Secretário de Estado de Assuntos Fiscais, pelo facto de lhe ter sido recusada a remuneração correspondente ao cargo em causa. O Tribunal, recorrendo ao Decreto-Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro, concluiu que o requerente tinha direito ao regime remuneratório em causa, condenando a entidade demandada a praticar o acto de atribuir a remuneração correspondente ao escalão ocupado pelo requerente.

[17] Cfr. António Cadilha, Os poderes de pronúncia jurisdicionais na acção de condenação à prática do acto devido, in «Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Sérvulo Correia» Volume II, Coimbra Editora, 2011.

 

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por Nuno Azevedo às 22:02

Quinta-feira, 28.11.13

Responsabilidade por Violação de Regras de Concurso no Âmbito de um Procedimento Pré-Contratual


1. Contencioso pré-contratual: Breve Introdução


O contencioso pré-contratual encontra-se regulado na secção II do Título IV do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de ora em diante, CPTA), mais concretamente nos artigos 100º a 103º. Constitui uma das modalidades de processos principais urgentes, enquadrando-se nas impugnações urgentes, a par da impugnação de actos administrativos em matéria eleitoral (artigos 97º a 99º CPTA). Dentro deste título inserem-se ainda as intimações urgentes que se dirigem à imposição à Administração da adopção de um comportamento, que poderá traduzir-se na prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões (arts. 104º a 108º CPTA) ou numa conduta positiva ou negativa que seja necessária para a protecção de direitos, liberdades e garantias (arts. 109º a 111º CPTA). 

Estes processos urgentes são assim designados visto que as quatro formas especiais neles previstas são legalmente instituídas em razão da urgência na obtenção de uma pronúncia sobre o mérito da causa por forma mais célere do que a que resulta da tramitação normal. 

Nota ainda para a remissão prevista no artigo 102º para a aplicação ao contencioso pré-contratual da tramitação da acção administrativa especial (arts. 78 e ss.), com as devidas especialidades. 

 

 

2. Enquadramento Normativo


Desde logo nota-se uma insuficiência de dados no direito positivo para a resolução do problema em apreço, quer no plano da lei ordinária, quer no do Direito da União Europeia e no do Direito Constitucional.

No entanto, apesar deste escassez, veio o novo Regime de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas (RRCEE) introduzir pela primeira vez no nosso Ordenamento Jurídico uma norma especial sobre esta matéria: o nº 2 do artigo 7º. Esta disposição não tem conteúdo próprio, sendo meramente remissiva. Numa primeira versão, este artigo remetia para o referido regime (RRCEE). Entretanto foi alterado pela Lei nº 31/2008, de 17 de Julho, e o regime passou a remeter expressamente para os requisitos da responsabilidade civil extracontratual definidos pelo direito comunitário. Não obstante, e acompanhando a doutrina do Dr. Rui Cardona Ferreira, esta actual redacção é fonte de incerteza jurídica, desde logo porque não esclarece se a remissão se refere ao regime geral da responsabilidade por violação do direito comunitário ou a um regime especial de responsabilidade consagrado nas Directivas Recurso.

Não obstante, não decorre destas regras uma clara orientação relativamente à ressarcibilidade do interesse contratual positivo ou à aferição do nexo de causalidade. Também a jurisprudência comunitária não tem tido uma orientação cristalina quanto a este aspecto, apesar de se inclinar para a recusa da indemnizabilidade do interesse contratual positivo. Analisando em concreto, infere-se que existem particularidades ponderosas em cada caso para a tomada desta decisão. 

Também na lei ordinária, mais especificamente no Código dos Contratos Públicos (CCP), não encontramos apoio para a resolução deste problema.

 

 

3. O Problema


Com o concurso para a celebração de um contrato, este implica a prática de actos jurídicos pré-contratuais. Este caracteriza-se pela sua abertura à pluralidade de interessados e à escolha entre eles. Suscitam-se aqui problemas se o contrato não for concluído com o lesado por violação das regras de concurso, não ser ele admitido, a sua oferta ser excluída, ou preterida a favor de um oferente com piores condições, como por o concurso ser revogado ou haver uma recusa de celebração do contrato com o vencedor. 

À luz dos artigos 41º e 42º do CCP, cumpre analisar quais os efeitos jurídicos que este acto de abertura produz nas esferas jurídicas, tanto da entidade adjudicante, como na dos concorrentes. 

Existem diversas teorias que tratam da natureza deste acto de abertura de concurso público. Destacam-se algumas.

A tese tradicional, a do convite a contratar, sufragada pelo prof. Marcello Caetano. A abertura é um mero convite aos concorrentes a apresentar as suas propostas, reservando a Administração o direito de contratar ou não. 

Opinião diferente tem o prof. Sérvulo Correia, que defende a tese da oferta ao público: onde a autonomia contratual da Administração desenvolve-se em dois momentos distintos. Num primeiro situa-se a decisão de contratar, executada pelos actos que formalizam uma proposta ao público; depois a Administração exerce a sua faculdade de aderir, com maior ou menor grau de autodeterminação às propostas que outros lhe apresentem.

Para a Dra. Margarida Olazabal Cabral, quando a Administração abre um concurso, tem a intenção séria de contratar, vinculada a um procedimento pré-estabelecido e a determinados princípios jurídicos. Esta é a tese da declaração negocial sui generis

Por fim, o prof. Menezes Cordeiro defende a tese da promessa unilateral do contrato. Não existe um convite a contratar já que não existe uma intenção definitiva para chegar a um consenso contratual com qualquer interessado. Também não se confunde com a simples promessa pública, já que assenta num processo com o objectivo de encontrar um co-contratante, nos termos de uma regulação mínima constante do termo de abertura do concurso ou do direito aplicável. 

 

 

4. Tomada de Posição

 

Na nossa opinião, e na esteira do Dr. Rui Cardona Ferreira, entendemos que a abertura de procedimento com vista à celebração de um contrato público não é subsumível em nenhuma previsão típica da lei civil e afigura-se como todo, globalmente, o sentido de uma verdadeira promessa pública. Assim, o declarante obriga-se unilateralmente, neste caso, a celebrar um contrato perante destinatários indeterminados, existindo um dever de celebração. A promessa pública é o único instituto através do qual podemos enquadrar a nossa explicação. Apesar de todas as dificuldades que possam ser suscitadas a propósito do preenchimento dos pressupostos dos quais depende a adjudicação, não deixa de haver um dever de celebração por parte da entidade adjudicante.

Tendo sempre em conta que a actividade administrativa está limitada e fundamentada pelo princípio da legalidade (arts. 266º2 da CRP e 3º/1 do Código de Procedimento Administrativo, CPA), a entidade adjudicante não dispõe de um poder ilimitado ou incondicionado de não adjudicar, apesar da sua discricionariedade.

Assim, em princípio a responsabilidade civil emergente para a entidade adjudicante da violação das regras de procedimento deveria situar-se no campo da responsabilidade obrigacional. No entanto, o problema tem sido resolvido pelas regras da responsabilidade civil extracontratual na doutrina e na jurisprudência no âmbito do RRCEE. 

Analisemos agora os casos que ocupam o nosso estudo: a não conclusão do contrato por violação de regras de concurso. Tal como o prof. Mota Pinto, entendemos que para determinar o cálculo da indemnização nestes casos devemos recorrer às regras gerais sobre a medida da indemnização, previstas no artigo 562º do Código Civil. Através da aplicação desta regra cumpre entender em que medida devem ser indemnizáveis os interesses contratuais negativo e positivo. Categorias também utilizadas pelas doutrinas alemã e italiana. Para isso, é míster apurar qual o evento que obriga à reparação.

 

a)No caso de a violação ter acontecido no início do procedimento concursal;

b)No caso de o lesado não ter vencido o concurso (adjudicação ilícita a outro concorrente) ou de ter sido ilegalmente revogado.

 

No primeiro conjunto de casos (a) está em causa a violação de deveres de cuidado ou de informação. Os concorrentes, se não se tivesse verificado a tal violação, não se teriam apresentado a concurso, nem teriam incorrido nas despesas daí resultantes. Por isso, a indemnização é correspondente ao interesse contratual negativo, mesmo que nunca tivesse ganho o concurso. Por outro lado, o concorrente que teria ganho o concurso não tem direito à indemnização correspondente ao interesse contratual positivo, visto que não se invoca aqui o facto de não ter vencido o concurso, mas apenas a violação de deveres que lhe gerou expectativas.

No segundo grupo (b), temos que delimitar i) se o autor do concurso se encontrava já vinculado pelas regras deste a celebrar o contrato ou ii) se era um mero convite a contratar, cabendo a última palavra ao organizador. Apenas na primeira hipótese (i) podemos colocar a questão de saber se é indemnizável o correspondente ao interesse contratual positivo, já que havia uma vinculação e uma obrigação de contratar. O lesado teria que provar que teria vencido o concurso e celebrado o contrato sem a violação. Se o conseguisse, então teria direito à indemnização. Em relação ao interesse contratual negativo não parece aplicar-se nesta situação pelo facto de o autor do concurso estar já vinculado a respeitar as regras. A indemnização seria então o que o interessado tivesse lucrado se tivesse celebrado o contrato. Não existe aqui uma inversão do ónus da prova, competindo esta ao lesado. Se não conseguir prová-lo, então não terá direito à indemnização. Na hipótese ii), a indemnização correspondente ao interesse contratual positivo não se coloca, visto que o concorrente não tem maneira de provar que ganharia o concurso, já que a última palavra era da entidade adjudicante. Se sem a violação não tivessem incorrido em despesas, os lesados teriam direito a exigir um ressarcimento equivalente ao interesse contratual negativo. 

Estas conclusões aplicam-se igualmente aos casos de revogação ou cancelamento ilícitos do concurso.

 

 

Bibliografia


- Almeida, Mário Aroso de, "Manual de Processo Administrativo", Almedina, 2013;


-Cadilha, Carlos Fernandes Cadilha e António, "O Contencioso Pré-Contratual e o Regime da Invalidade dos Contratos Públicos", Almedina, 2013;


- Caupers, João, "Introdução ao Direito Administrativo", 9º Edição, Âncora Editora, 2003;


-Ferreira, Rui Cardona, "Indemnização do Interesse Contratual Positivo e Perda de Chance", Coimbra Editora


-Pinto, Paulo Mota, "Responsabilidade por Violação de Regras de Concurso para Celebração de um Contrato", in "Estudos de Contratação Pública - II"


 


Luís Soares de Sousa




 

 

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por Luís Soares de Sousa às 18:18

Quarta-feira, 27.11.13

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 Alegações Finais de Noe das Arcas

 

 

Proc. Nº. 111/666AB

Acção Administrativa Especial de Impugnação de normas

 

Autor: Noé das Arcas

Réus: Ministério da Agricultura e do Mar e Companhia Carris de Ferro de Lisboa, SA.

 

 

 

Vem o Autor, Noe das Arcas

Apresentar as suas,

Alegações Finais 

 

 

Consideramos o 1º quesito da base instrutória como provado, na medida em que o testemunho foi coerente, conforme e nunca contraditório, par além de vir provado na acta de condóminos do dia 4 de Outubro de 2013.


O A. apenas transportava consigo ao momento da entrada no elétrico os dois pequenos cães, considerando que tal facto ficou provado na audiência uma vez que a testemunha Joana Nunes quando inquirida acerca do tamanho dos animais deu a entender, através de gestos que estes não teriam mais de 30 cm tal como também o afirmou José Pascoal da Noruega. Não ficando por isso provado que o A. Se fazia acompanhar dos animais referidos no anexo 4 da contestação da R. Carris.

 

Quanto à prova do anexo 4 apresentado pela R. cumpre apenas referir que não ficou provado que o A. transportava quaisquer outros animais que não os dois referidos cães. Assim e pela impossibilidade de entrada do A. Nunca foi afirmado pela sua parte que não tinha ido posteriormente ao veterinário. Mais, nada impediria que o A. regressasse a casa e posteriormente se fizesse então acompanhar pelas referidas cobras. Tanto que, não ficou provada a hora de entrada do A. no elétrico. Não se demonstra tal anexo (anexo4) apresentado pela R. necessário à comprovação de qualquer dos quesitos da base instrutória.

Verificou-se que a testemunha arrolada pelo A. nesta parte foi coerente nas respostas às suas inquirições, o mesmo não poderá dizer-se quanto às testemunhas arroladas pela R.

 

Resulta daqui que não seria possível dois cães recém-nascidos circularem na via pública com trela.

 

Estando os referidos animais dentro de caixas especificamente produzidas e destinadas ao seu transporte não procede o argumento que deveriam ir ainda açaimados, na medida em que para todos os efeitos o cão se encontra já privado de qualquer contacto com seres humanos, estando ainda em maiores condições de salvaguarda do que se fossem transportados por trela e com açaime em que poderiam perturbar as pessoas.

 

Da inquirição do Condutor do eléctrico, João Galhofinho, não resultou qualquer outra indicação que pusesse em causa a afirmação do ponto 27º da PI do A., foi antes apresentada prova de que a testemunha fazia parte de uma Associção de Animais, não sendo verdadeiramente posta em causa a afirmação e argumentação do A. à proibição de entrada naquele meio de transporte.

 

Quanto à capacidade do eléctrico deve ainda entender-se que que o seu limite de capacidade não ficou provado pela R. Assim em nada interessava a existência de pessoas com prioridade na medida em que ainda era possível a sua entrada, não tendo inclusive o condutor referido como ficou provado pela sua inquirição que não deixou entrar o A. pela existência de pessoas com prioridade.

Considera-se provado o ponto 9º da base instrutória, na medida em que não foi posto em causa o testemunho de Noé e ainda de Jorge Pascoal da Noruega.

 

Não se considera provado que o A. tenha sido abalroado pelos dois cães uma vez que estes não tinham força para o fazer devido às suas dimensões e aos seus problemas respiratórios. Para mais, o testemunho de Jorge Pascoal da Noruega e de Noé das Arcas vêm provar que a queda foi provocada pelo arranque inesperado e descuidado do eléctrico. Acrescente-se ainda arroladas pela R.

 

O facto de o condutor da carris, Sr. Galhofinho, ter dito que não voltou a encontrar o A. não ficou provado dado que este afirmou que eram poucas as vezes que fazia esse percurso demonstrando pouco conhecimento acerca do mesmo.

 

 

Pelo testemunho dado pelo psiquiatra, tal como pelo patrão do A. e ainda pela avença apresentada como prova considera-se o direito à indemnização nos termos do artigo 564º código civil.

 

Conforme ficou provado com a inquirição do psiquiatra do autor, Dr. Freud, houve de facto uma relação directa entre a aprovação do regulamento uma vez que aquele tinha receio de vir perder os seus animais como é aliás confirmado pelo próprio.

 

Ficou igualmente provado que a depressão afectou o seu desempenho laboral pelos testemunhos de Carlos Carvalhadas e de Dr. Freud tendo posteriormente levado ao seu despedimento.

 

Considera-se provado que a circular proibia a entrada de todos e quaisquer animais através do testemunho de Filipe Chelas e do anexo 7 da PI do A. Compete ainda referir que nestes termos a relação de tutela não teria de mais relevância na medida em que importaria averiguar seria o facto de a Carris ter extrapolado o alcance do regulamento, fazendo diferente interpretação do lá é referido. Apurámos que a Carris se fez valer do Regulamento para proibir algo para o qual não tinha base jurídica.

O incidente de falsidade levantado pela R. vem por em causa o pedido feito pelo A. no entanto deve atender-se ser esse o único meio possível  (de acordo com o artigo 372º do código civil) de afastar o documento apresentado pelo A. pelo que deve o tribunal considerar que nada obstava a que o conselho de administração emanasse nova circular. Isto parece comprovar-se na medida em que A testemunha Joana Nunes vem afirmar que lhe foi comunicado que seria emanada nova circular, comprovando implicitamente a existência de duas circulares.

Por via do artigo 370º do código civil é necessário que o documento tenha assinatura reconhecida pelo notário ou selo do respetivo serviço, pelo que tanto o documento apresentado pelo A. como o apresentado pelo R. padecem.

Assim, parece não tratar-se de documento autêntico nos termos do artigo 369º e 370 do código civil, não podendo portanto fazer prova plena dos factos que atesta.

 

Coloca-se a questão de saber qual dos dois documentos é verdadeiro, ou antes, se estamos perante um caso em que é emanado um segundo documento com a função de obter os factos atestados no primeiro documento.

Desta forma resta verificar que estamos antes, perante um caso de livre apreciação segundo o Professor Miguel Teixeira de Sousa, por interpretação do artigo 371º do código civil à contrário.

Por tudo o referido e apurado na audiência, reconhecemos ser o documento apresentado pelo A. o verdadeiro, ou pelo menos o primeiro a ser emanado, sendo que tudo leva a crer que o segundo documento elencado pela R. é realizado posteriormente, com o simples intuito de encobrir os efeitos produzidos pelo primeiro, de forma a evitar as consequências daí resultantes.

 

Os Advogados,

André Gaspar

António Belair

Diogo Tadeu

Guilherme Silva

Miguel Bento Ribeiro

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por Miguel Ribeiro às 22:09

Quarta-feira, 27.11.13

ALEGAÇÕES FINAIS CARRIS, SA.

 

 

 

Proc. Nº. 111/666AB

Acção Administrativa Especial de Impugnação de normas

 

Autor: Noé das Arcas

Réus: Ministério da Agricultura e do Mar e Companhia Carris de Ferro de Lisboa, SA.

 

 

 

Vem a RÉ, COMPANHIA CARRIS DE FERRO DE LISBOA, SA.,

Apresentar as suas,

 

 

ALEGAÇÕES FINAIS

 

 

Perante os controvertidos discutidos na presente Audiência do Tribunal, cumpre referir:

 

1. É àquele que invoca a violação de um direito ou interesse legalmente protegido que cabe provar a existência e, à partida, a proveniência causal das lesões alegadas, nomeadamente nos termos gerais do art. 342.º/1 CC.

 

2. Quanto aos factos alegados pelo A., constantes da Base Instrutória definida pelo Colectivo, temos a considerar:

- Os testemunhos produzidos nesta audiência quanto ao porte dos animais [2) da base instrutória], são contraditórios, pelo que não se deverá dar por comprovado o facto de serem “de pequeno porte”, como alega o A.,

- Ademais, a R. juntou prova aos autos [Anexo 4] da marcação de consultas no hospital veterinário, agendadas para o dia dos factos em discussão, 3 de Novembro. Ora, nas fichas dos pacientes, os dois cães de raça Grand Danois, faz-se referência à data de nascimento dos mesmos: 14/04/2010,

- Pelo que, caberá à luz do exposto e do conhecimento baseados nas regrais gerais da experiência máxima da vida, avaliar se um cão de raça Grand Danois com cerca de 3 anos de idade, poderá ser considerado um cão de “pequeno porte”.

 

3. que aqui se disse para contestar a falta de evidência probatória, e por essa via, a impossibilidade de formular um juízo de convicção revelador de um grau raiano de certeza, resultante das discrepâncias entre os depoimentos aqui produzidos, valerá de igual forma para negar a afirmação dos factos controvertidos constantes dos quesitos 3), 6), 7) e 9) da base instrutória.

 

4. Quanto ao documento apresentado pelo A. como sendo uma primeira circular interna emitida pelo administrador da R., existe fornecimento de prova anexa aos autos pela R. (ANEXO 7) de que o Documento apresentado pelo A. é falso.

 

5. O administrador da R. emitiu uma única circular interna, no dia 23 de Outubro de 2013, a qual foi junta aos autos.

 

6. Daqui resultou uma discordância na qualificação jurídica da prova documental entre a R. e o Colectivo.

 

7. A R. mantém a qualificação anteriormente apresentada, defendendo que a circular é, para efeitos probatórios, um documento autêntico, desde logo por o critério definido pelo art. 369.º/1 atender apenas à matéria e lugar de emissão do documento, e não a um critério funcional, que o faria depender de ser emitido no exercício de poderes de autoridade. Desta forma, levantou a R. o incidente de Falsidade do documento autêntico, nos termos do art. 372.º/2 do CC.

 

8. Ainda que se considerasse a Circular um documento particular, nos termos dispostos nos arts. 373.º e ss. CC, o valor probatório a atribuir-lhe seria o de Prova Bastante, pelo que basta a aposição de dúvidas sobre a veracidade do documento ou assinatura nele aposta, para que seja ao A. cometido o ónus de provar que esse documento é verdadeiro, o que o A. não logrou fazer (cf. art 374.º/2 CC).

 

9. Igualmente, a R. poderá valer-se do mecanismo constante do art. 376.º/1, in fine (“sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento”), norma esta que, por maioria de razão, nos levará de novo à disposição do art. 372.º/2 CC, na qual é regulada a falsidade de documento.

 

10. Assim, por tudo o que aqui foi exposto, deve a R. ser absolvida de todos os pedidos contra si formulados, bem como o A. condenado ao pagamento das custas processuais.

 

 

As advogadas da parte,

Catarina MS Santinha,

Isabel M.ª Pereira

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por imgarciapereira às 15:40

Quarta-feira, 27.11.13

Resposta aos Requerimentos apresentados pela Nós É mais Bolos

TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA

 

Processo 111/666AB

 

Aos requerimentos apresentados pela Nós É Mais Bolos, Sociedade de Advogados, R.L. com escritório na Avenida da Liberdade nº 14 5ºD Lisboa, na qualidade de mandatário judicial de Noé das Arcas, é dado deferimento.

Notifique-se também a Companhia Carris de Ferro de Lisboa, SA como parte contrária, nos termos do art. 427 do Código de Processo Civil.

 

Os Juízes de Direito,

 

André Fortunato

Francisco Rodrigues

Gonçalo Sousa

Nuno Azevedo

Raquel Dias

Rui Duarte

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por Raquel Dias às 07:53

Quarta-feira, 27.11.13

...

Exmo. Senhor Juiz

do Tribunal Administrativo e Fiscal de Círculo de Lisboa

 

 

 

 

Assunto: Requerimento de apresentação de nova prova documental

 

 

A Nós É Mais Bolos, Sociedade de Advogados, R.L. com escritório na Avenida da Liberdade nº 14 5ºD Lisboa, na qualidade de mandatário judicial de Noé das Arcas vem requerer, ao abrigo do art. 423º/2 do Código de Processo Civil, a apresentação de nova prova documental, prova esta que não seguiu com o articulado da petição inicial.

Ainda de acordo com o mesmo preceito legal e visto que este documento está a ser apresentado tardiamente, aceita-se a respectiva condenação em multa.

 

 

Junta: contrato de avença de Noé das Arcas com taxista

 

Pede Deferimento

 

Os advogados:

André Gaspar

António Belair

Diogo Tadeu

Guilherme Silva

Miguel Bento Ribeiro

 

Exmo. Senhor Juiz

do Tribunal Administrativo e Fiscal de Círculo de Lisboa

 

 

 

 

Assunto: Requerimento de apresentação de nova prova documental

 

 

A Nós É Mais Bolos, Sociedade de Advogados, R.L. com escritório na Avenida da Liberdade nº 14 5ºD Lisboa, na qualidade de mandatário judicial de Noé das Arcas vem requerer, ao abrigo do art. 423º/23do Código de Processo Civil, a apresentação de nova prova documental, prova esta que não seguiu com o articulado da petição inicial dado que não foi possível a sua apresentação até ao momento. 

 

Junta: Documento audio

 

Pede Deferimento

 

Os advogados:

André Gaspar

António Belair

Diogo Tadeu

Guilherme Silva

Miguel Bento Ribeiro

 

Exmo. Senhor Juiz

do Tribunal Administrativo e Fiscal de Círculo de Lisboa

 

 

 

 

Assunto: Requerimento de apresentação de nova prova documental

 

 

A Nós É Mais Bolos, Sociedade de Advogados, R.L. com escritório na Avenida da Liberdade nº 14 5ºD Lisboa, na qualidade de mandatário judicial de Noé das Arcas vem requerer, ao abrigo do art. 423º/2 do Código de Processo Civil, a apresentação de nova prova documental, prova esta que não seguiu com o articulado da petição inicial.

Ainda de acordo com o mesmo preceito legal e visto que este documento está a ser apresentado tardiamente, aceita-se a respectiva condenação em multa.

 

 

Junta: Acta número 69 da assembleia de condóminos do prédio número 48 sito na rua Serpa Pinto, Lisboa

 

Pede Deferimento

 

Os advogados:

André Gaspar

António Belair

Diogo Tadeu

Guilherme Silva

Miguel Bento Ribeiro

 

Nota: Seguem os respetivos documentos por email

Autoria e outros dados (tags, etc)

por Miguel Ribeiro às 00:46

Terça-feira, 26.11.13

Despacho Saneador II

 

 

TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA

 

Proc. nº. 111/666AB

Acção Administrativa Especial de Impugnação de normas

Data: 26-11-13

Autores: Noé das Arcas

Réus: Ministério da Agricultura e do Mar e Companhia Carris de Ferro de Lisboa, SA.

Contra-interessados: Vizinho Fonseca da Silva

 

 

Assunto: Notificação para despacho saneador.

 

Fica V. Ex. notificado relativamente ao processo supra indicado do despacho que se junta.

 

 

Notifique.

 

Lisboa, 26 de Novembro de 2013.

 

 

O oficial de Justiça,

 

 

Clarence Seedorf


 

 

TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA

 

 

 

I-Identificação das partes e objecto do litígio

 

 

Noé das Arcas, melhor identificado no cabeçalho da petição inicial, vem interpor a presente acção administrativa especial contra o Ministério da Agricultura e Mar e contra a Companhia Carris de Ferro de Lisboa, S.A.

Contra a primeira Ré, o Autor formula, dois pedidos: a desaplicação ao caso concreto de normas do regulamento citado e um pedido de indemnização no valor de 10.000 euros. Contra a segunda Ré, o Autor formula igualmente dois pedidos cumulativos: assim, formula pedido de abstenção da conduta por parte da Ré cumulado com um pedido de indemnização no valor de 10.000 euros.

 

II-   Saneamento processual:

 

  1. O Tribunal é absoluta e relativamente competente.

 

  1. As partes são legítimas, têm personalidade e capacidade judiciária.

 

  1. O processo é o próprio e mostra-se válido.

 

  1. Não existem excepções ou questões prévias que obstem ao conhecimento do objecto do processo.

 

 

III-             Diligências de Prova

 

O Autor não usou da faculdade cometida pelo disposto no art. 78/4, do C.P.T.A, não tendo requerido dispensa de apresentação de alegações, o que obsta à prolação de despacho saneador sentença, em face do disposto no art 87/1-b, do C.P.T.A.

 

A ré Companhia Carris de Ferro de Lisboa, SA, vem impugnar a assinatura aposta à directiva interna da Carris (anexo 7 da PI), impugnação essa regularmente deduzida à luz do art. 444 do CPC.

 

 Testemunhas arroladas pelo Autor:

 

João Galhofinho, casado, Rua da Alfândega, nº 14, 3ºD, Lisboa.

 

Jorge Pascoal da Noruega, Rua do Carmo, nº 140, 3º E, Lisboa.

 

Américo Freud, Avenida da República, nº 56, 5º E, Lisboa.

 

Carlos Carvalhadas, Rua Augusta, nº 7, 1ºD, Lisboa.

 

Filipe Chelas, Rua Sociedade Farmacêutica, nº 11, 3º D, Lisboa.

 

Carlão Silveira, Avenida Duque de Loulé, nº 46, 1º E, Lisboa.

 

Assunção Pistas, Avenida Fontes Pereira de Melo, nº 50 2º E, Lisboa.

 

 Testemunhas arroladas pela Ré, Ministério da Agricultura:

 

Teresa Maria Rodrigues, casada, portadora do cartão de cidadão número 14562787, residente na Rua João Anastácio Rosa nº 14 1200 – 694, Santa Isabel, Lisboa.

 

Henrique Cabecinhas, casado, portador do cartão de cidadão número 13966772, residente na Rua Serpa Pinto, nº15, 2º D, 1200-442, Lisboa.

 

 Inês Cabral Oliveira, solteira, portadora do cartão de cidadão número 186478523, residente na Rua Augusto Luso, nº 118, 1º D, 4050-072.

 

 

Testemunhas arroladas pela Ré, Carris S.A:

 

João Galhofinho, residente na Rua da Alfândega, nº 14, 3º D, Lisboa

 

Joana Nunes, solteira, residente na Rua das Amoreiras, nº5, 1º E, Lisboa

 

Rafael Mendes, viúvo, residente Álvaro Benamor, nº 4, Rés-do-chão A, Lisboa

 

Susana Ferreira, casada, residente na Rua da Ilha dos Amores, nº 35, 5º D, Lisboa.

 


***

 

Factos assentes

 

A)     O A. habita na Rua Serpa Pinto, nº 15, 3º Dto., fracção autónoma de duas assoalhadas e com uma cascata.

 

B)     No dia 3 de novembro de 2013, o A. foi impedido de entrar no eléctrico 28, carreira assegurada pela Ré, C. SA.

 

 

C)     O Autor transportava consigo, no momento em que pretendia entrar no elétrico, dois cães.

 

D)     O condutor do elétrico, JG, impediu o A. de entrar no dito meio de transporte, justificando tal conduta com a aplicação do novo regulamento dos animais domésticos.

 

E)      O Autor caiu junto do elétrico, sofrendo alguns danos.

 

F)      O Autor foi despedido do seu trabalho com base em faltas injustificadas.

 

 

Base instrutória

 

1)      O A. habita com 4 macacos, 4 gatos, 4 cães, 4 periquitos, 4 araras, 4 hamsters, 4 tartarugas, 4 cobras de água, 4 lagartos, e um conjunto de insectos?

 

2)      Os cães, com quem o A. se fazia acompanhar, no momento em que pretendia entrar no eléctrico, no dia 3 de Novembro de 2013, eram de pequeno porte?

 

3)      Os cães eram transportados em caixas próprias para o efeito?

 

4)      Os cães estavam açaimados, quando o A. pretendeu entrar no elétrico?

 

5)      O A. fazia-se acompanhar de mais algum animal nesse dia?

 

6)      O condutor do eléctrico invocou diferentes razões, para além da aplicação do regulamento, para vedar a entrada do A. no dito meio de transporte?

 

7)      O eléctrico encontrava-se próximo do limite da sua capacidade de utilização?

 

8)      Procuravam entrar na carreira, ao mesmo tempo que o A., utentes com prioridade?

 

9)      O A. caiu por força do arranque do elétrico?

 

10)   Durante o restante mês de Novembro, foi o A. impedido de entrar nos transportes da Carris porque sempre se apresentou com animais em condições que não permitiam a sua circulação em meios de transporte públicos?

 

11)   O A. teve com isso despesas económicas extraordinárias por ter recorrido a outros meios de transporte?

 

12)   O A. desenvolveu uma depressão nervosa depois de tomar conhecimento da aprovação do regulamento?

 

13)   Essa depressão nervosa afectou o seu desempenho laboral?

 

14)   O inferior desempenho laboral foi também causa do despedimento?

 

15)   A circular interna da Carris determinava que ninguém poderia entrar nos seus meios de transporte acompanhado de animais?

 

 

 

 

Lisboa, 26 de Novembro de 2013,

 

Os Juízes de Direito,

 

  • André Fortunato
  • Francisco Rodrigues
  • Gonçalo Sousa
  • Nuno Azevedo
  • Raquel Dias
  • Rui Duarte

 

NOTA: A procuração forense não está assinada pelo A., o que pode levar à sua inadequação para conferir mandato judicial, e consequente inexistência de patrocínio judiciário. A petição inicial não procede à cabal indicação do nome e residência dos contra-interessados, motivo bastante para a sua recusa pela secretaria (art. 80/1b CPTA), e ainda obstáculo ao prosseguimento do processo (art. 89/1f). Ao pedido de indemnização por lucros cessantes, falta a causa de pedir, não se bastando para tal a afirmação genérica de que o autor se viu privado de certas vantagens. Quanto à matéria de facto seleccionada para a base instrutória, apenas se coloca o que parece relevante para a decisão da causa, atendendo aos pedidos do autor e à defesa dos vários réus.

 

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por André Fortunato às 22:00

Terça-feira, 26.11.13

Resposta ao Requerimento apresentado pela sociedade de Advogados PROMS

TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA

 

Processo 111/666AB

 

Ao requerimento apresentado pela sociedade de Advogados PROMS, RL, com sede na Avenida da Liberdade, nº 249, 7º andar, Lisboa, na qualidade de mandatário judicial do Ministério da Agricultura e do Mar, com vista à apresentação de nova prova documental, é dado deferimento.

Notifique-se também Noé das Arcas, como parte contrária, nos termos do art. 427 do Código de Processo Civil.

 

Os Juízes de Direito,

 

André Fortunato

Francisco Rodrigues

Gonçalo Sousa

Nuno Azevedo

Raquel Dias

Rui Duarte

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por Raquel Dias às 18:46

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